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25 DE MARÇO DE 2020, QUARTA-FEIRA
FONTE: RC
Preparar o segundo século comunista!
Os 100 anos do PCP e o futuro do ideal comunista.
Cem anos de luta dos comunistas portugueses – A VISÂO RENOVADORA
O centenário do PCP, que ocorre no próximo ano, mas mereceu já da atual direção partidária o anúncio do seu programa de comemorações, levam a Renovação Comunista a tornar pública a sua própria perspetiva dos 100 de luta dos comunistas portugueses.
I - O nascimento dos partidos social-democratas e comunistas no século XIX correspondeu a uma revolução no conhecimento humano anunciada no manifesto comunista de Marx e Engels de 1848.

A consciência social acendeu-se com o aparecimento de um novo modo de produção, o capitalismo na agricultura e na indústria.

Nasceu com ele uma classe operária transformada por saberes novos fruto da revolução tecnológica.

Embora em anarquia na economia global, a classe operária foi moldada pelo trabalho cooperativo no seio da empresa - qual ante-câmara de uma sociedade avançada e criativa.

Uma classe operária que compreendeu e incorporou a consciência da natureza exploradora das relações sociais assalariadas e do capital reveladas pela filosofia e a ciência económica e assim tornou as utopias de emancipação que sempre iluminaram os sonhos humanos, em possibilidade concreta, reconhecível e realizável.

Fê-lo com a construção de uma intervenção organizada e uma teoria política e económica robustas e com isso atraiu muitos outros segmentos da sociedade para um projeto onde encontram realização as mais vastas aspirações humanas.

Ergueu o projeto internacionalista de um mundo livre da segmentação nacional, raça ou religião, de associação cooperativa de trabalhadores onde se poderão garantir as condições e meios de vida para todos, controlados e projetados em democracia por todos, ao ponto de libertar o homem das tarefas penosas da subsistência e ganhar a liberdade criativa plena. A nova ideia foi denominada como o “assalto ao céu” na expressão com que Marx saudou os comunardos de Paris em 1871, a primeira revolução operária comunista da história.

Com ênfase na sua assinatura global, internacionalista, foi em poucas décadas formada a Associação Internacional de Trabalhadores - 28 de setembro de 1864, em St. Martin's Hall, em Londres - à qual sucedeu a IIª Internacional no Congresso Internacional em Paris, em 14 de julho de 1889. Depois da rotura, em 1914, entre internacionalistas e chauvinistas, deu lugar à IIIª Internacional fundada em março de 1919 em Petrogrado.

É uma época onde nascem por toda a parte partidos operários.

Em Gotha, em 22 de maio de 1875 é fundado o partido social-democrata alemão.

Em Minsk, é fundado o partido operário social-democrata russo, em 13 de março de 1898.

II - Com a vitória da revolução de Outubro, acelera-se a formação de partidos operários pelo mundo.

Surge em Xangai o partido comunista chinês a 23 de julho de 1921.

É no impulso do Grande Outubro russo que Lisboa vê nascer, em 6 de Março de 1921, o Partido Comunista Português.

Desde então, não mais deixaram os comunistas de estar no fulcro da transformação politica do país, como nas campanhas e movimentos democráticos que abalaram a ditadura, em 1945/46, em 48/49, em 58/59, em Outubro/ Novembro de 73, como nos movimentos grevistas de 1942/43 e no surto de greves de finais de 1973 e inícios de 1974, como na vitória luminosa como as 8h00 de trabalho nos campos do Alentejo em 1962, mas também nas derrotas, discussões e divisões.

Enfrentando todos os reveses os comunistas os comunistas ajustaram a linha política e encontraram o caminho melhor para fazer do campo comunista e do PCP a força motriz de transformação no último século.

Mesmo as traições e abandonos que o movimento sofreu nunca deixaram de desencadear respostas que robusteceram a ação mais adiante.

Foi pela superação das diferenças, tantas vezes dirimidas em torno da política de alianças, que venceu em momentos chave a política de unidade. Foi esta política que acabou por sair vitoriosa na conquista da liberdade, no fim da guerra colonial em aliança com os movimentos de libertação, na saga da reforma agrária e nos avanços sociais e económicos da revolução de Abril.

A abnegação dos comunistas na luta pela liberdade e pelo socialismo, merece toda a celebração, sem exclusões, nem omissões.

Figuras tão vibrantes e influentes marcaram a história comunista portuguesa, como Bento Gonçalves, o secretário geral refundador da base ideológica e organizativa do partido, que morreu martirizado no Campo de Concentração do Tarrafal; ou como Humbert-Droz, o delegado da Internacional que acompanhou os primeiros passos do PCP; ou como os destacados dirigentes, José Gregório, Militão Ribeiro, Júlio Fogaça, Francisco Miguel, Octávio Pato, Jaime Serra, Dias Lourenço, Alda Nogueira, Ângelo Veloso; ou como os eminentes militantes, Bento Jesus Caraça, Soeiro Pereira Gomes, Alves Redol, José de Sousa, Gabriel Pedro, Ludgero Pinto Bastos, Cansado Gonçalves, Vasco de Carvalho, Francisco Martins Rodrigues, José Dias Coelho, José Saramago. E, é claro, Álvaro Cunhal, o líder que mais influenciou os 100 anos do PCP e que foi, porventura, a figura maior na condução do processo que permitiu o derrube do fascismo e o desenvolvimento impetuoso da revolução de Abril.

É uma galeria impressionante de gente, muita dela anónima, em muitos casos de uma heroicidade inigualável, face à polícia política, à tortura e às longas prisões com brutais períodos de isolamento, como nas temíveis gavetas do Aljube ou na frigideira do campo de concentração do Tarrafal. Foi esta gente que moldou a nossa história e que merece ser homenageada.

E devemos dirigir, ainda, a nossa atenção para figuras mais recentes que tão resolutamente quiseram dotar o movimento de uma nova capacidade com forte representação parlamentar e com vocação de influenciar a governação para conquistar posições na esfera do Estado, a par da valorização da ação popular, como Luís Sá, João Amaral, Barros Moura e Edgar Correia.

Importa sublinhar que foram, o campo comunista e o PCP, tão decisivos no derrube da ditadura como na própria instituição do regime democrático, no que foi a projeção de uma visão avançada que a Constituição contém, o seu desígnio socialista, fruto igualmente uma certeira política de alianças e de convergência alargada com o centro-esquerda.

Gerações e gerações de comunistas deram o seu melhor para a concretização de tarefas imediatas, greves, abaixo-assinados, manifestações, campanhas eleitorais, em condições de grande repressão, no tempo da ditadura, nas igualmente nas condições do Portugal democrático, na disputa do poder autárquico e nas eleições gerais, na luta de massas contra o capital e por avanços sociais e políticos para uma sociedade mais coesa.

A ação do campo comunista, mesmo no mais modesto movimento de uma comissão de moradores até à mais poderosa ação de massas, à negociação parlamentar ou de acordos de incidência governamental nunca deixou nem deve deixar de estar articulada com o ideal comunista da luta por uma sociedade livre da exploração em associação cooperativa e democrática dos trabalhadores onde a liberdade e a realização de cada um será a condição da liberdade e realização de todos.

III - O ideal comunista sofreu neste século evoluções que não deixaram de gerar divisões, debate e tiveram influência na conduta política.

Episódios tão fraturantes e guinadas históricas tão abruptas como sucederam na época do pacto Ribbentrop-Molotov que dividiu a frente anti-fascista, ou do relatório “secreto” de Kruchev ao XXº Congresso do PCUS com a denúncia do estalinismo, ao conflito sino-soviético, à Perestroika e à derrocada da União Soviética, em todos esses momentos emergiram novas respostas que reajustaram a visão comunista.

Quando tal debate não teve lugar, ou foi (ou é) obstaculizado, acaba o movimento por estiolar, por não responder às novas circunstâncias e perder influência no desenvolvimento político e na força de atração da ideia comunista.

O fechamento e enquistamento são os riscos maiores que ameaçam o futuro do movimento e os comunistas portugueses devem combatê-los com persistência na busca de uma constante renovação do pensamento e da ação.

Este estiolamento está hoje demasiado presente no campo comunista e no PCP, por não ter sido empreendido suficiente debate sobre o projeto de uma nova sociedade à luz das tendências históricas atuais.

Estão elas marcadas por uma diversificação das relações de produção (assalariamento, trabalho à peça, precariedade, empresários em nome individual), porém com agravamento da magnitude da exploração do trabalhador com maior sobrevalor extraído a favor do capital, em especial do capital financeirizado que vive do crédito, juros e rendas, pela diversificação social da base laboral com maior importância dos serviços, maior incorporação da tecnologia e grau crescente de instrução e preparação da mão de obra.

No seu conjunto, colocam exigências novas à capacidade de representação política dos comunistas e à geração de um bloco social de hegemonia a favor do trabalho e colocam, ainda, a exigência de responder, na teoria e na ação, ao crescimento da consciência sobre o que deve ser uma relação equilibrada do homem com a natureza, equilíbrio tão ameaçado por um capitalismo sem freio e predador.

Atrasou-se o debate sobre o significado da experiência da União Soviética, das razões do seu colapso e das opções que partidos comunistas adotaram, após 1989, como tentativa de adaptação do projeto comunista. São os casos da política de abertura na China Popular, o período especial em Cuba e as opções de tipo mercantil no Vietname. Não se debateu a arquitetura democrática do socialismo, nem o papel da economia estatal como ideia mistificada de produção socialista que nunca pode, e não deve ser sinónimo de socialismo nem com ele se deve confundir.

Relançar o papel transformador do campo comunista e do partido comunista, retomar a iniciativa histórica, pressupõe uma reflexão audaciosa do que deverá ser um programa de transição nas presentes condições do capitalismo e da defesa do clima e da natureza e definir a tática para pressionar mudanças na direção do socialismo. E pressupõe uma avaliação das alianças capazes de fazer o processo avançar. São estas as tarefas que devem mobilizar em prioridade os comunistas no momento em que vão celebrar os 100 anos do PCP.

IV - Embora ninguém possa recusar a possibilidade de ruturas revolucionárias acontecerem quando testemunhamos crises de crescente magnitude no capitalismo, vivemos por agora em Portugal uma época de disputa de posições, passo a passo, no estado e na cultura e no reforço da representação popular.

Exigem-se para tal alianças alargadas e a construção de uma ampla maioria de mudança com um lugar central à convergência, nunca isenta de tensões, entre esquerda e o centro-esquerda, entre comunistas e socialistas.

O acontecimento auspicioso que mais fez oscilar o edifício do poder de direita e da sua aliança contranatura com o centro-esquerda, aliança que dominou o país durante décadas, aconteceu em 2015 com o acordo do PS com as esquerdas. Foi esse ato súbito a resposta à reclamação popular perante a crise económica e os riscos sociais em deixar prosseguir a precedente orientação capitalista de brutal retrocesso económico.

Num curtíssimo espaço de horas ou dias, reconstituiu-se uma ampla aliança social e parlamentar que roubou iniciativa à direita e a relegou para a impotência política.

O país saudou a nova orientação e apoiou as medidas de restituição de rendimentos e de direitos de que tinha sido espoliado no ciclo anterior.

Por ter sido um ato sem a devida preparação programática e teórica, a pilotagem da convergência foi sempre frágil, sem que o campo comunista tomasse a linha da frente na defesa de um programa de transformações que, não só emendasse as consequências da crise, mas sobretudo abrisse o caminho para uma democracia mais avançada capaz de escapar à anarquia das crises recorrentes do capitalismo.

Subsiste, aliás, entre muitos comunistas e na direção do PCP, designadamente, um forte defensismo em assumir – e liderar - posições de reforma e transformação. Desvaloriza-se o potencial político de influenciar essa transformação e de disputar posições no Estado e no governo. O defensismo prevalecente conforta-se com um oposicionismo inconsequente que se abriga de pressionar mudanças no chamado estado social ou na regionalização.

Foi assim que se resvalou para uma errada orientação de demarcação em relação a acordos calendarizados nas eleições de 2019, entre comunistas e socialistas, na mira de voltar a um estatuto oposicionista que não arriscasse as dores da governação. Apesar da enorme simpatia popular que a continuação dessa convergência suscitava e suscita, ainda hoje, o PCP alienou o capital político conseguido no ciclo anterior ao recusar, expressamente, um novo acordo para a governação.

Para os que pensaram que o regresso ao estatuto oposicionista do PCP constituiria um refúgio contra as agruras da governação abrigando-o de abraçar um programa concreto de ganhos políticos e económicos, ficam agora confrontados com um país com governação sem sentido estratégico, por falta de suporte político popular e parlamentar suficientes, ainda para mais sob a realidade de uma nova crise no capitalismo mundial em desenvolvimento que exige resposta e atuação firmes. Se nada for feito e se for mantido um governo minoritário frágil, isso facilitará as manobras da direita e não conseguirá contrariar a tempestade que aí vem.

A crise em que entrámos é precipitada pela pandemia, é certo, mas já antes estava em maturação acelerada em diversos marcadores económicos e sociais. Esse quadro em nada aconselhava passividade para com a constituição de um governo minoritário, sem a força mobilizadora de compromissos políticos claros a serem reclamados pela esquerda. Agora, perante o avolumar da crise, o país exige com mais força ainda, ao centro-esquerda e à esquerda, que cumpram as suas responsabilidades históricas. Exige ao PCP e ao campo comunista que promovam, imediatamente, uma solução urgente e ampla de convergência para defender os trabalhadores da catástrofe que se avizinha.

Os 100 anos do PCP devem ser celebrados por todos os comunistas, estejam hoje no PCP ou não, e nenhum comunista deve ser excluído do debate por um Portugal e um mundo melhores. Os 100 anos celebram o passado em todas as suas dimensões, mas deverão mobilizar todos na tarefa de retomar o caminho do socialismo e resolver no plano programático, das alianças e da ação popular, as tarefas inadiáveis do progresso.

Essa é a perspetiva que deve preparar o segundo século comunista.



 

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