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21 DE JUNHO DE 2016, TERÇA FEIRA
FONTE: RC
POR: Paulo Fidalgo
Quem pode agarrar a unificação da Europa?
Depois do NÃO inglês, como conduzir a luta?
“[O Brexit] É a recusa de uma Europa a toque de caixa, comandada pela Alemanha. Este o principal significado, entre muitos outros.” Carlos Brito

O Brexit derrotou a linha do ordoliberalismo soprado pela Alemanha e secundado por outros lá fora e, alguns, cá dentro, como Passos Coelho e o seu enfraquecido PSD.

Não foi, porém, derrotada a política de direita que hegemoniza tanto governos europeus como o Reino Unido. A demissão de Cameron, pode até trazer para a área do poder gente radical de direita, nos Tories e mesmo com o UKIP.

Para a corrente comunista, geneticamente ligada ao “façamos, nesta luta final, uma terra sem amos, a Internacional” nos célebres versos do hino dos trabalhadores, o que ainda assim é de valorizar é a expressão do voto na permanência, maioritário na Escócia, Irlanda do Norte e em Londres.

No estado comatoso em que está a UE, de uma crise que não abranda, e no quadro de aberta contestação às receitas do capitalismo financeirizado, como é que subsiste tanto apego à ideia de caminharmos juntos, de montarmos um dispositivo comum, solidário, por entre a enorme diversidade do continente.

O impulso à ideia Internacional só na aparência retrocedeu, pois, muitos votos no Brexit, são votos por uma construção alternativa da Europa. O que assistimos é à demonstração de incapacidade das classes dominantes europeias em continuarem a ser agentes de uma construção supranacional, como tinham prometido na formação da CEE. As classes dominantes falharam, e fizeram-no rotundamente! É porventura o tempo de aparecer outra gente a trabalhar para uma humanidade sem segmentações e agarrar o sonho de montar um dispositivo supranacional solidário com base na luta dos trabalhadores e na reorientação da economia. É cada vez mais esta mudança de liderança histórica que pode estar a acontecer e que é necessário que aconteça.

O projeto europeu nasce de fontes diversas: pulsão “ultraimperialista” remotamente formulada por Karl Kautsky em 1914, em que se admitiu que as potências beligerantes poderiam, um dia, “num rodopiante passo de dança”, assentar numa trégua a bem dos negócios, o que de facto veio a acontecer, não no final da primeira Guerra, mas no final da segunda guerra; impulso objetivo do capitalismo para superar as barreiras aduaneiras e restaurar a taxa de lucro; e oposição à força do bloco dos países do chamado socialismo real.

Ideologicamente, o capitalismo elaborou na ideia, de resto cada vez mais mistificadora, de que a cooperação entre povos, desde sempre perseguida pelos comunistas, poderia ser afinal edificada na base do capitalismo. Prometiam-se taxas de crescimento interessantes, acima dos 3% ao ano, em que os salários poderiam crescer, mas sem ligação ao crescimento dos lucros e com políticas públicas de apoio social a cargo do Estado e não das empresas, com benefício destas na competitividade capitalista.

Desde os anos 70 do século XX, ganhou força a conceção de que o modo de produção capitalista mudou para uma morfologia financeirizada, assente na hegemonia do chamado capital portador de juros. Curiosamente, ou talvez não, adquiriu preponderância essa faceta na “City” de Londres, com um volume de operações em bolsa e off-shore superior às outras praças financeiras. A City percebeu a pressão da opinião pública europeia (e inglesa também) para se aumentarem os controles e tornar mais difícil a obscena pirataria financeira. A City e Cameron (um primeiro ministro ligado ao escândalo off shore dos Panama Papers) lembraram-se então de jogar ao poker e convocaram o referendo, não necessariamente para ir para o Brexit, mas para fazer bluff com ele e pressionar a UE a isentar o UK de quaisquer regras limitadoras da pirataria. Cedendo a UE à pressão da City, como cedeu, passaria então Cameron a recomendar a manutenção. Em toda a obscena trafulhice das classes dominantes inglesas, pode ver-se como, apesar da retórica, elas só olham a supracionalidade como meio para regatearem mesquinhos interesses.

A saída do UK é um colapso crítico da ideia de Europa unida que convoca a uma vasta reorientação política e económica do projeto, com frontal rutura com a linha austeritária do diretório europeu e conquista de maior democracia e controle pelos povos. A ideia internacional não vai deixar de exercer sobre todos os povos uma poderosa atração. Cabe à esquerda empunhar a construção de um espaço de coesão e prosperidade.


 

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