O desafio que se coloca hoje à esquerda é fazer propostas baseadas em análises profundas e suficientemente precisas para que sejam operativas, audazes e populares, visando contribuir para a mais ampla unidade de acção. É certo que existe uma crise do liberalismo e da finança desregrada, mas existe sobretudo uma nova maturação da crise sistémica. O sistema enlouqueceu.
Clima favorável a transformações profundas
Se o sistema enlouqueceu, não é porque haveria zonas onde o capitalismo se tornou sadio e normal, como dá a entender Nicolas Sarkozy, mas porque a sua lógica de rentabilidade financeira foi levada ao paroxismo.
É inútil falar de moralização e de transparência sem que se avance para novas regras. É impossível retornar a um capitalismo de nossos avós ou de Keynes, porque as profundíssimas transformações que exacerbaram o capitalismo são irreversíveis. Trata-se da revolução no campo da informação com a escalada das multinacionais, é a revolução monetária com o descolamento da moeda em relação ao ouro, e a hegemonia do dólar, etc.
A escalada das intervenções dos Estados e da regulação dos mercados manifesta um clima novo, favorável a transformações profundas para controlar os mercados e começar a emancipar-se das regras do capitalismo enlouquecido. É uma alteração histórica! Mas uma maior intervenção dos Estados e da regulação não serão suficientes caso se permaneça agarrado às regras do sistema.
Crise reclama medidas imediatamente estruturais
A esquerda deve ir além dessa alternativa tradicional entre mercado e Estado. Do lado do Estado, é preciso uma verdadeira democracia participativa dando efectivos poderes de intervenção e controle aos trabalhadores e aos cidadãos junto às empresas e aos serviços públicos. Do lado dos mercados, é necessário impor-se a eles com avanços radicais na partilha e serviços públicos inovadores.
Face à escalada do desemprego, por todo o mundo, trata-se do aumento dos salários, de uma outra organização do trabalho, e, de forma colaborante, de segurança no emprego e de formação.
Não acredito que o plano Sarkozy caminhe na direcção certa, nem que o problema seja fazer mais e mais cedo. A crise reclama medidas imediatamente estruturais. Entre elas: um crédito selectivo; novos critérios de gestão de empresas; novas instituições bancárias e monetárias ao nível local e mundial (fundos regionais, pólo público, moeda comum mundial).Ver
l'Humanité de 13 de Outubro.
Ver também – em francês – a entrevista com Boccara publicada por L'Humanité, de 13 de Outubro, sob o título Il faut s’en prendre aux règles fondamentales du capitalisme.
Origem do artigo: l'Humanité; títulos e tradução do Vermelho, adaptação ao português de Portugal: JNF
Nota: é impossível, por razões informáticas que desconhecemos, linkar a entrevista em francês de Paul Boccara. Procurar no l'Humanité