O orçamento participativo pode ser um instrumento de re-dinamização da vida democrática na cidade, numa época de "homogeneização" das opções entre candidaturas, fruto da elevada percentagem dos recursos cometida a despesas fixas incontornáveis.
Numa sociedade democrática relativamente estável o acesso aos bens de consumo é determinado por vários factores: disponibilidade económica do consumidor, conhecimento do produto, preço relativo do mesmo, facilidade de acesso e influencia do marketing.
Na compra de bens a opção do consumidor tem efeitos imediatos e detectáveis: a qualidade e quantidade do produto adquirido é função da escolha no acto da compra. Já a prestação de serviços públicos- acessos rodoviários, limpeza municipal, conservação de espaços públicos, rede de transportes etc. pode ser influenciada pela opção de voto, mas só de forma muito indirecta e de dificilmente evidenciada.
O cidadão, consumidor de quase tudo, sabe que independentemente das suas escolhas os serviços públicos não deixarão de lhe ser prestados, e de forma idêntica, quaisquer que sejam as cores dos responsáveis do poder local eleitos. Sabe também que é muitas vezes difÃcil distinguir a qualidade desses serviços públicos quando dirigidos por autarcas eleitos por partidos muito diferentes.
A motivação do cidadão para votar numa eleição local, isto é escolher o perfil do prestador de serviços de gestão autárquica vai deixar de ter muito dos incentivos que são a aliciante da escolha de produtos ou serviços de outra natureza:
- disponibilidade económica do consumidor, não interfere na decisão pois o voto é grátis;
- conhecimento do produto é cada vez mais superficial, em particular no que diz respeito aos figurantes menos destacados das listas;
- preço relativo do serviço de gestão autárquico, neste caso a quantidade de serviços relevantes que podem ser assegurados por uma dada vereação, é também uma incógnita de difÃcil de apreciação;
- influencia do marketing , sem dúvida o principal argumento capaz de alterar as decisões e atrair o votante. Imagine-se uma eleição autárquica onde apenas fossem divulgados as listas dos candidato e respectivos programas, sem cartazes, entrevistas a órgãos de comunicação, distribuição de brindes e carros de som. A participação seria certamente baixÃssima e os resultados talvez fossem surpreendentes.
A "normalidade democrática" torna a escolha pouco atractiva essencialmente pela pequena diferença que resulta da vitória deste ou daquele candidato. A maior parte das decisões serão inevitáveis, os orçamentos grandemente comprometidos à priori por encargos fixos, as promessas eleitorais dissolvidas pelas desculpas de circunstância, a lógica aparelhistica a impor os seus ditames e o desinteresse instalado nos eleitores.
Por tudo isto a procura de novas formas de envolvimento do cidadão em parte das decisões poderá aproximar o eleitor da polÃtica, principalmente se este se sentir menos consumidor compulsivo, e tiver a liberdade de propor ou apoiar directamente uma opção concreta que lhe diga particularmente respeito.
A experiência da implementação de sistemas de Orçamento Participativo terá pelo menos a vantagem de dinamizar o envolvimento cÃvico dos cidadãos e permitirá uma compreensão melhor dos problemas locais.
A questão é saber de entre as centenas de experiências já feitas noutros paÃses, e mesmo em Portugal, qual a modalidade mais interessante para a divulgação do processo.
No link
link
encontra-se uma panorâmica sobre o assunto que pode ser interessante
José Cavalheiro